segunda-feira, 7 de maio de 2012

CARTA DE PIERRE VICTOR RENAULT

CARTA DE VICTOR RENAULT








Barbacena, 17 de outubro de 1877.



Meu bom irmão Léon.



No dia 6 do corrente mês, eu te escrevi uma longa carta em reposta à tua

carta do dia 1º de setembro e eu inclui um retrato meu tirado em agosto de

1876 lamentando muito não ter podido te enviar ainda os retratos da minha

família, por falta de um fotógrafo que passe por aqui.(...). Chegado ao

Rio, sem nenhum recurso, foi-me necessário encontrar os meios de poder

me transportar para o interior da província de Minas, à procura de um emprego

como engenheiro numa mina de ouro, e da qual me haviam falado

em Paris, na embaixada do Brasil.(...). Enfim após ter perambulado durante

2 anos, e vendido pouco a pouco a roupa que eu havia trazido da França,

encontrei-me no fim dos meus recursos, e cada vez mais com uma forte

inflamação no fígado. Eu achei uma casa caridosa que me tratou, e em

troca, durante meu tratamento, eu ensinava a ler e a escrever, à criança

da casa, o que me valeu um transporte gratuito até Sabará, com algumas

camisas que me havia dado, a dona da casa. Enfim chegado a Sabará,

cidade bastante importante, eu comecei a dar aulas de francês, inglês,

química, física, matemática e alemão(...),Propuseram-me atravessar um

terreno frequentado por selvagens antropófagos que diziam negros, e que

tinham recusado com raiva todas as tentativas feitas para penetrar nas

suas florestas.(...). Logo sou assaltado pelos Nak-Nanukes ( habitantes

das montanhas ) e pertencentes a grande família dos Botocudos, selvagens

nômades, antropófagos e muito ferozes. Eu tinha um intérprete que

lhes faz compreender que não lhes quero nenhum mal, e que eu lhes trazia

presentes(...). Eles são negros, é verdade, quando eles estão em guerra ou

na caça, porque eles se pintam o corpo com a fruta do Jenipapo ( Genipa

Brasiliensis ), uma rubiácea, o que lhes impede de ficar muito a vista no

meio dos tufos de árvore.



















Eles estão inteiramente nus, homens e mulheres, e não se dignavam mesmo

a esconder a nudez com fizeram Adão e Eva. Eu era o primeiro homem

que eles viam, por isso quantas exclamações vendo nossas vestimentas,

nossas armas, nossos víveres, que eles não conheciam, e sobretudo o sal

que os obrigava a raspar a língua, e a gritar ( muguang - Krok ) água de

fogo. Apesar de que estas damas estejam inteiramente nuas, elas acharam

apesar disso um meio de dar curso à sua vaidade, que ao que parece,

é inerente a humanidade. (...) Quando nos salões dourados, eu vejo nobres

damas, e belos senhores, se entregarem ao prazer de um galope, eu imagino

a dança dos selvagens, e sua cadência, e eu tenho vontade de rir.

Mas é preciso partir e eu estou apenas no começo da minha viagem. Mas,

por qual lado tomar? (...)Eu subo o Jequitinhonha ( ? ) costeando um caminho

aberto pelos Botocudos Krekmas, e no final de 18 meses de uma

viagem cheia de perigos, de privações de todos os gêneros, eu chequei a

Ouro Preto ( ? ) capital da província, onde o presidente ficou muito contente

com o meu trabalho, e me fez elogios oficiais que conservo para meus

filhos..(...)





Tu me fizeste tremer na sua boa carta quando tu me dizias que tu tinhas

vontade de partir comigo! Deus preserve meu maior inimigo de sair de

seu pais, de perder de vista seu campanário, pois não é somente a terrível

nostalgia que nos apunhala, é a comparação que vos torna infeliz, e se tem

a ocasião de faze-la diariamente. Infeliz fora de seu pais, o seria na nossa

pátria, e não poderia mais nada em lugar nenhum, e é isso que me acontece.

É preciso entretanto que eu termine esta carta já longa e que me deu

muita dor por causa da dificuldade que eu tenho de escrever. (...)Eu teria

querido publicar todas as minhas viagens e as descobertas que eu fiz, mas

eu não tenho mais energia e esta carta já me cansou muito. Talvez meus

filhos acharão algumas notas minhas, das quais eles poderão aproveitar.

Eu vivo então mais ou menos o dia a dia, mas eu vivo e eu tentarei a cura

de um outro louco quando eu tiver curado aquele que eu tenho atualmente

em casa.

Ainda uma vez, eu abraço minhas irmãs e minhas cunhadas, e sou teu

irmão que te ama.

Victor Renault

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